sexta-feira, 31 de julho de 2009

Um presente indesejado.

O dia amanheceu. Como sempre ele o via lá. Parado. Sobre seus dois pés cansados.
"- Se ao menos pudesse ouvir tua voz - ele lamentou - teria tanto para conversarmos..."
O rio os separava de forma semiótica. Todas pontes que haviam sido construídas foram metaforicamente derrubadas. Por vezes, as aguas do rio eram violentas e turvas. Haviam os dias em que eram calmas e transparentes como em contos de fada.
Mas mesmo nesses dias, ninguém o atravessava. Não se arriscava nem um aceno que fosse.
Atravessar jamais foi uma opção.
Do silêncio das duas bocas, tudo que se podia ouvir eram os olhares. E ainda assim, somente um observador extremamente astuto conseguiria distinguir a educação exemplar do desejo ardente, que se revelava com o dilatar das pupilas diante de seus olhos cruzados.
E a todo sol o mesmo ritual se repetiria. Cada qual do seu lado. Cada um Rei de seu castelo vazio.

Até que um dia...

... um deles esperaria sua companhia silenciosa chegar.

Mas ninguém apareceria.

O silêncio de um dos lados do rio, preferiu pelo motivo que fosse, partir. Ele não voltaria ao rio. Não ficaria mais ali, dia após dia. Seu vazio havia dado ao outro lado uma nova companheira.
Um presente indesejado, é verdade. Daqueles que não se pode trocar, devolver ou esquecer que se ganhou.

Não.

Sozinho, ele divagou:
"- Minha nova companhia, se chama tristeza... Finalmente tenho alguém comigo deste lado do rio."

"A Gente nasce e morre só.
E talvez, seja por isso mesmo é que se precise tanto viver acompanhado." (Rachel de Queiroz)

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