segunda-feira, 11 de dezembro de 2017

Te vejo depois.

Tempo, nobre amigo, para onde vais com tanta pressa? Para onde escorre essa tua areia tão fina, que é? Como eu recupero aqueles dias? Tu que nos foge sem alarde, e quando vemos, só deixasses saudades... Eu te imagino, fugindo para algum recanto do universo. Como uma poesia desconhecida guardada a sete chaves. Em uma gaveta antiga. Depositada entre cartas de amor que nunca forem entregues. Entre músicas que ninguém mais escuta. E livros que não tem o final feliz. E ali tu ficas. Como poeira fina. Quase invisível. Que só aparece após décadas de acúmulo.
E é aí, que vemos as horas do relógio. E pensamos:

"- Quanto tempo faz...?".
Faz tempo! E sobra menos dele a cada tempo que se faz. O tempo é ardiloso. Esperto como ele só. Tempo se perde, quase nunca se ganha. Tempo se tinha, quase sempre não se tem mais... Tempo flutua, como vento, invisível sobre todos nós. Mas não refresca, não te brisa. Não, o tempo te engana. Tens tempo, resolve amanhã. Outra hora tu ligas. Se não der hoje, tudo bem. Ele te diz. E nós acreditamos como crianças que acreditam no Papai Noel. Ignorantes de que a vida e o tempo não são um só. Mas que caminham passos próximos. Como duas pernas do mesmo corpo, se movendo por entre as estrelas conhecidas da nossa galáxia. Na busca do desconhecido que é essa vida de segunda a sexta feira. De conta a serem pagas. De mãos que precisam ser apertadas. De curtidas no facebook e relacionamentos solitários.
Tu vem sozinho para esse mundo, e é sozinho que vais embora. Alguém me diz. O tempo que tens é o tempo que te sobra. E não ter mais tempo, é como chegar ao final de um texto. Um livro não te pede licença. Não te avisa que vai acabar.
Ele termina. E te diz antes de sair: 

"- Valeu, te vejo depois...".
E tu pensa:

"- Depois é bom, vai dar tempo..."
 

terça-feira, 5 de dezembro de 2017

Eu prefiro abstrair.

É por bem que eu não curto discutir. Tudo bem que ninguém diz que curte discutir. Mas eu penso que tudo se enrola muito quando as ondas da discussão se chocam no meu mar. E tu fica confuso, vendo aquele monte de espuma em cima da água. Indo para lá e vindo para cá. Sem parar de borbulhar. E girar. E subir e descer.
A confusão é parte da vida, eu sei. E nem vou negar, dizendo que prefiro a permanência total do silêncio. Não prefiro. A vida sem caos é tediosa. Ao mesmo tempo que seu destempero a compromete. Como um doce muito doce, ou nada doce. Ou um salgado muito salgado, ou nada salgado. É preciso saber tempera-la. Espera-la marinar. E saber o tempo certo de entrada e saída do forno. A vida queima. E vida queimada é normalmente amarga. Produz caretas de asco em quem a consome.
Acho que como qualquer um de nós, eu também já comi porções de vida queimada. Vida queimada não se vomita pela boca. Vida queimada se vomita pelas lágrimas dos olhos. Vida queimada escorre salgada, mesmo quando doce. Evapora silenciosa, invisível ao mundo enxergador. E some no universo depois disso. Como poeira cósmica.
E é ali, quando isso tudo passa. Naquele momento em que o gosto já diminuiu bastante, mas ainda não se acabou. Que eu prefiro fingir que comi doces morangos da estação. Bem quando a boca geme silenciosa porque as lágrimas salgadas a enchem de náusea. Que aprendi a seguir em frente.
Muita gente volta para o prato e lambe as migalhas da vida queimada. Como um prazer sórdido de um doente que não consegue mais decidir o que pode ou não fazer.
Eu deixo o prato para trás. E admito que já fiz isso no meio da refeição. Nem sempre com razão. Nem sempre bem. Nem sempre feliz. E também não fiz por mal não. Fiz porque a espuma do choque entre as ondas do nosso mar me confunde mais do que me resolve.
E talvez eu tenha me acostumado a transição. A mudança. A troca das estações. E menos ao calor do sol. Ao vento do inverno. Ao por do sol do outono.
Ou talvez a minha alma flutue em ciclos maiores do que essa vida. Se abstraindo da vida sempre que o amargo se torna regra. Sempre que o caminho, me quebra a perna.

domingo, 3 de dezembro de 2017

A vida é uma curtida do facebook.

Me canta Cícero ao pé do ouvido: a vida segue sem alarde. 
Naquela ligação que tu ias fazer, mas ficou para mais tarde.
Com o teu amigo que ias tomar uma, mas não aconteceu.

Tipo aquele texto que eu escrevi em um guardanapo, e que se perdeu.
Ou aquele desenho que a gente rabiscou, e ninguém mais viu.
A vida se esgueira por entre os "tic-tacs" dos relógios.
A cada pulsação do coração, ela se encurta.

Na rotina dos dias ela se acostuma.
Como uma dança hipnotizante, ela te prende parado.
A vida te faz capacho.
E tu de joelho dobrado, se sente elogiado.
Até o dia em que tuas mãos se enrugam.
Teus olhos e ouvidos, falham.

E tu pergunta:
"- Para onde foram todos esses anos?"
E a vida responde com um sorriso de chumbo.
Um sorriso de vala, com pregos e caixão,

no fundo.
E de lá, soterrado nos dias que tu viveu, tu pensas:

"- O que foi que aconteceu?"
Nada demais.
Tu só viveu.