quinta-feira, 26 de novembro de 2009

"Bem vindo a America..." - Stratopumas.

Sonho acordado, é verdade.
Eu me vejo mal desenhado em um pedaço de papel velho.
Me cortam a face pra mostrar a verdade.
E prefiro os desenhos do que as palavras.

Eu minto para os meus pés.
"- Não aguentamos mais" - eles suplicam.
"- Só mais um passo... E nada mais" - respondo rindo.
E o caminho não para de girar, feito escada rolante.

Não sinto hoje a dor que me abraça amanhã.
Dor e tempo são difíceis de medir.
Ninguém lembra direito de mim, eu prefiro assim.
Vulto pra foto, mais uma lembrança e palavra perdida na frase.

Me guardo aqui.
Longe de qualquer mão, pé cansado ou olho azul.
Invisível ao importar.
Sem semblante pra expor.
Nada é igual ali.

Mas de novo, prefiro assim.
Sem mais aos outros.
O tudo mais de mim.



terça-feira, 24 de novembro de 2009

Disse Fernando Pessoa:

Todas as cartas de amor são
Ridículas.
Não seriam cartas de amor se não fossem
Ridículas.

Também escrevi em meu tempo cartas de amor,
Como as outras,
Ridículas.

As cartas de amor, se há amor,
Têm de ser
Ridículas.

Mas, afinal,
Só as criaturas que nunca escreveram
Cartas de amor
É que são
Ridículas.

Quem me dera no tempo em que escrevia
Sem dar por isso
Cartas de amor
Ridículas.

A verdade é que hoje
As minhas memórias
Dessas cartas de amor
É que são
Ridículas.

segunda-feira, 23 de novembro de 2009

As infindáveis aventuras de Simon e seu unicórnio negro albino.

Se as nuvens fossem feitas de algodão doce as abelhas fariam suas colmeias sobre elas. Existiriam nuvens cor de rosa, azul claro e bege. E os aviões bateriam nelas enquanto sobrevoam o céu, fazem o algodão cair sobre nossas cabeças.

Se o gramado falasse, eles seriam multidões nas praças, campos e canteiros. Ninguém estaria sozinho, ou seria obrigado a fingir que gosta dos amigos que na verdade nem conhece direito. Não. O gramado sempre estaria lá, cheio de opiniões e esclarecimentos sobre as nossas vidas.

Se os prédios pudessem se mover, nós sempre teríamos vizinhos novos e nunca saberíamos aonde nossas casas "estão agora".
"- Alo ? Leandro ?"
"- Oi cara, fala ! Tudo bem ?"
"- Aaaah sim ! Acho que teu prédio tá parado aqui na minha rua..."
"- Bá que legal ! A gente se fala depois então... : )"
Seria bom.

Se o cães pudessem tivessem asas eles seriam muito mais divertidos. Dá pra imaginar os bandos voando e brincando no céu. Tá certo que provavelmente nenhum deles ia ser pirado por bolinhas de borracha... Mas ainda assim seria legal ! Eles voariam direto para os nossos colos, cairiam em cheio dentro das nossas piscinas, subiriam em nossos telhados e uivariam durante a noite. As carrocinhas seriam helicópteros e as casinhas teriam pistas de decolagem e pouso.

Se toda flor fosse comestível, você poderia dar um bouquet de jantar pra sua esposa. Elas não seriam doces ou salgadas. Teriam gosto de flores. 
"- Eu prefiro girassóis, ela prefere rosas !"
"- Recebi violetas deliciosas essa manhã..."

Se todo livro tivesse seu final escrito por quem o lê, ninguém assistiria novelas ou programas escrotos de domingo a tarde... Tá eu sei que ainda assim alguém assistiria ! Mas gosto de pensar que não. Que as pessoas iriam preferir passar a tarde fazendo amor e inventando finais para livros do que assistindo a idiotice que jorra da televisão nesse período.

Se as fotos se movessem você sempre saberia o que veio depois dela. Como pequenos pedaços de filmes antigos seus personagens se moveriam tranquilamente pelo enquadramento. Alguns poderiam falar ou sorrir outros precisariam chorar ou ficar tristes. Assim elas jamais causariam a impressão errada... Ou sempre causariam... A questão é que as suas lembranças sempre estariam alí. Não em um click discreto. Mas nas conversas, piadas e lágrimas que existiram de fato...

Se os pianos cantassem eles seguiriam o ritmo de seus pianistas. Poderiam dar entrevistas dizendo:
"- Eu já cantei para Frank Sinatra !"
ou
"- Eu fui filmado em 1932 por Alfred Hitchcock..."

Se você pudesse se teleportar sempre que o mundo te chateasse, você poderia mudar o lugar onde vive. Desaparecer e voltar. Ver o horizonte morrendo e nascendo aonde desejasse. Quando desejasse. Com quem desejasse. Mas a regra seria brutal: você só poderia se teleportar quando o mundo te chateasse, sem exceções.

Se fosse assim talvez, o mundo e as suas idiotices aparentemente incontroláveis não me cansassem tanto.

Se fosse...





sexta-feira, 20 de novembro de 2009

Eu e os dias que perdi.

Alguém me disse que a vida adulta não te deixa muitas opções. Concordo, por mais livre que sejamos. A liberdade que vivemos é algo bem pouco verdadeiro. E eu já disse antes: eu gosto do que é de verdade. Do cheiro daquela pele que não sei o nome, mas que fica entre o lábio superior e as narinas. Das bochechas vermelhas de vergonha ou prazer. Do sorriso feliz que vem sem poder ser controlado. E do carinho público.
(texto não terminado)

quarta-feira, 18 de novembro de 2009

No escuro.

Onde ninguém vê o visível.
E o invisível segue nú entrando nos corpos sem pudor.
Perto do segredo escuro guardado no fundo do poço de inigualável odor.
Ao lado do mistério do amor que a mentira adora violar.
Regado com carinho verdadeiro que ninguém consegue negar.
Longe dos tantos pés, mãos, corpos e lábios entrelaçados que constroem a torre do prazer.
Com a luz acesa mas longe do claro e iluminado ver.
Pra onde correm os ratos que fazemos questão de esconder.
Abaixo do que chamamos de tudo mesmo sem quase nada entender.
Interrompido somente pela morte dos vivos, que insiste em se suceder.

Escuro pra caralho.

segunda-feira, 16 de novembro de 2009

sexta-feira, 13 de novembro de 2009

Amor e traição - Cruz e Sousa

Ninguém sentiu o teu espasmo obscuro,
Ó ser humilde entre os humildes seres.
Embriagado, tonto dos prazeres,
O mundo para ti foi negro e duro.

Atravessaste no silêncio escuro
A vida presa a trágicos deveres
E chegaste ao saber de altos saberes
Tornando-te mais simples e mais puro.

Ninguém te viu o sentimento inquieto,
Magoado, oculto e aterrador, secreto,
Que o coração te apunhalou no mundo.

Mas eu, que sempre te segui os passos,
Sei que cruz infernal prendeu-te os braços,
E o teu suspiro como foi profundo!

quinta-feira, 12 de novembro de 2009

Com(texto)

Minha cidade é bonita. É serio ! É um bom lugar para viver. As pessoas criam raízes aqui... Vem de longe às vezes, trazendo suas famílias. Procurando o "algo melhor" que todo e qualquer ser humano sem doenças mentais, deseja. 
Temos orgulho de viver aqui. De fazermos parte do que é ser desse lugar. Muitos de nós ajudaram a reconstruir a cidade depois dos vários incidentes naturais que se passaram. Resistimos as enchentes, a doenças, a crises políticas e fomos adiante. Evoluímos muito nos últimos anos. A Oktoberfest mudou seu público e volta pouco a pouco a ter aquele ar bonito, quase lúdico. As reuniões de grupos de amigos que acontecem semanalmente também não deixam por merecer. As coisas vão bem, de fato... Em vários sentidos.
Pois bem, hoje eu voltava do banco até meu carro que estava estacionado em uma das principais ruas do centro, a Rua XV de Novembro, quando vi algo que me incomodou. A rua XV foi revitalizada e não são todos os que lembram como ela era antes. Tinha paralelepipidos antigos e irregulares por toda sua extensão. Não tinha uma calçada uniforme com faixas de segurança e vagas para veículos bem definidas. Não era arborizada, nem tinha lixeiros. Não era iluminada como é hoje ou tinha cameras de segurança que funcionam de forma duvidosa. Era outra rua, mais feia. Menos apresentável. Depois da revitalização, se tornou um lugar melhor, como o município vem se tornando. Mais limpo, mais bonito, mais seguro.
Pois bem, ia eu em direção ao meu carro recebendo o sol que atravessava as folhas das árvores com felicidade. Quando vi um pedaço de um dos canteiros absolutamente pisoteado. Mas tão pisoteado que já havia só barro. Vermelho como sangue que jorra de um ferimento.
É só grama, alguém dirá !
É verdade, é só grama. Mas ao mesmo tempo não é. Ao mesmo tempo, aquele pedaço de gramado com pouco mais de um metro quadrado, totalmente destruído, sendo pisoteado pelos pés apressados de quem não tem tempo a perder. É também um pouco dessa terra sofrendo. É um pouco de nós não se importando. É um pouco da antiga rua XV saindo do caixão como um zumbi do Thriller. Com a mão putrefata suja de terra cerrando os dedos e avisando que retornará a caminhar pelo mundo das "ruas vivas" caso alguém não lhe abata. Parei e perdi 2 minutos vendo quantas pessoas pisavam ali, sem nem perceber talvez. Não foram poucas, infelizmente.
Minha cidade aprendeu através das décadas que a força da natureza não é comparável a mísera existência humana. Recentemente perdemos uma Figueira que era mantida majestosa em frente a nossa Prefeitura. Ela não caiu, mas morreu. Os jornais publicaram a notícia, as rádios gritaram aos ouvidos, as televisões tocaram músicas de despedida e nosso Prefeito declarou sábia e solenemente:
"- Se depender de mim, não corto a figueira..."
Claro, quem gostaria de carregar o título de "usurpador de símbolos municipais" ? Ninguém que tenha alguma orientação publicitária, eu digo. Depois de um tempo descobriu-se que o motivo da morte da grande árvore fora a poda irregular que por sua vez, era/é responsabilidade da administração pública. Vergonhoso, eu sei. Mas a vida continuou e a natureza estendeu novamente sua mão em nossa direção... Um broto da antiga figueira nasceu em meio as suas raízes. Como uma promessa de que devemos continuar nosso caminho, aprendendo com os erros e repetindo os acertos.
O gramado pisoteado é algo trivial. Pouco importante eu admito. O que me incomoda são os passos sobre a grama. São as pessoas não se importando com o fato de estarem destruindo um pouco do que lutamos para construir. Exatamente como a grande Figueira morta na praça. 
Meu pensamento trilha um caminho débil, mas pode ser o fim desse ciclo: A figueira morreu por falta de cuidado e o gramado foi expulso do seu lugar pela pressa daqueles que não tem mais aonde pisar. Mas ainda assim, ainda com nossa negligência e falta de respeito a natureza nos devolve a vida. Nos dá uma nova árvore para a praça, basta que cuidemos dela. E mais grama para o canteiro, basta que paremos de pisoteá-lo.


quarta-feira, 11 de novembro de 2009

E de sorrir (pra não chorar).

Se passou por aqui, 
só o perfume senti.
Parado vi o carnaval passar.
Sobraram os confetes e 
as risadas.
Sempre sobram. 
Ou choram.
E de passo em passo
carregando o peso.
Descubro escrito o que sempre esqueço:
O fim do mundo é o 
recomeço.

terça-feira, 10 de novembro de 2009

Censurado

Morro, se corro.
Se fico, choro em coro.
E algo mudou ?
Lágrimas me fogem dos olhos à correr.
A vida me escorre dos dias à morrer.
Deposito aos jarros meu amar.
Conservado no pensar.
Mas não como coisa largada ao deixar.
Nem as teias do passar.
Deixo perto das fotos que vivi,
para alguém além de mim.
Que carregue aos bolsos o sorrir.
E nos lábios do existir tenha a força pra ver.
A palavra a dizer.
A gentileza do carinho ao caminho do merecer.
E o suave esquecer.
Que me rende o rompante, 
no peito guardado.
Me força a ficar parado.
Gritando aos pulmões, 
ainda que calado.
O título censurado.

segunda-feira, 9 de novembro de 2009

Simples até demais.

Ele se matou durante o inverno. Sumiu sob o álibi de pegar um casaco, disse estar com frio. Todos estavam, todos acreditaram. Tomou todo o pote de anti-depressivos. Não conseguia engolir remédios grandes, nunca conseguiu.
"- Mas se eu engasgar morro do mesmo jeito..." - pensou com tom ironico.
Esperou pacientemente sem saber o que pensar. Pensou sobre o que as pessoas pensam quando se matam. Não conseguiu ficar feliz, mas também não se arrependeu. Pensou ter certeza.

Se sentiu tonto e com os dois braços dormentes.

Abriu a porta do banheiro quando percebeu que não poderia voltar atrás.
"- Assim ninguém precisará arromba-la quando sentirem minha falta..." - foi prático.

Ninguém sentiu sua falta.

Morreu, assim.

sexta-feira, 6 de novembro de 2009

Caro amigo...

Corra sempre que possível. O horizonte nem é tão longe assim e teus pés dão conta de te levar até lá.

Não se confunda, a amizade é uma das coisas mais bonitas que existem sobre a face do planeta... Mas é natural que todo ser humano queira a companhia dos seus. Assim, na ânsia de não estar só ele pode tropeçar.

Blinde seu coração. Mas não de forma dura e insensível. Aprenda que seu coração vai se machucar e que é preciso continuar mesmo não conseguindo.

Entenda a vida além dos seu corpo. O mundo é um lugar incrível, basta que você se permita enxerga-lo.

Toque um instrumento ou pinte um quadro ou faça ginástica na praça ao lado de desconhecidos. Pessoas desconhecidas lhe impressionarão se tiverem uma chance real.

Fale e silencie com a mesma frequência. Saber ouvir e responder educadamente as perguntas que lhe são feitas são as chaves para qualquer porta que encontrares.

Tire fotos suas e de sua família. Com o tempo essas lembranças se tornarão muito mais valiosas que as jóias de sua tataravó.

Sorria a estranhos na rua. Cumprimente-as sem medo. Segure as portas para os outros, permita que alguém além de você passe... Dê sua vez nas filas.

Respire suavemente sempre que possível. Mesmo nas grandes cidades é possível encontrar um bom lugar para respirar.

Durma quando estiver dormindo. Acorde quando estiver acordado. Desligue-se do mundo com seus celulares, telefones, pagers e conexões de alta velocidade. Respeite os limites do seu cansaço ou você não se respeitará...

Acredite. Em Deus, nos olhos de sua namorada, nos conselhos de sua família, nas verdade de seus amigos, nos seus professores, acredite no seu instrutor de academia, no padre, no paderio, no médico ou no seu mecânico... Não importa no que ! Acredite em alguma coisa. Viver sem acreditar é como comprar vários cadernos e não escrever nenhuma linha deles...

Tome sorvete nos dia quentes. Comer é um dos bons prazeres de viver. Cuide do seu corpo, mas não se negue eternamente. É normal que a idade lhe pese os ombros e lhe alcance os calcanhares em algum momento. Aceite seus fios de cabelos brancos e as rugas dos olhos. Envelhecer é um privilegio que nem todo ser humano tem. Desfrute-o.

Diga que ama. Ame seu cachorro, gato, jabuti e papagaio. Ame a sua saúde. Ame a sua vontade. Aprenda a não odiar o que você vê no espelho. E se em algum momento a coisa ficar feia. Use essa força como motor para melhorar. 

Leia. Blogs, sites, revistas e se sobrar tempo livros. Leia com respeito e com vontade de entender. Seja intenso quando ler. 

Não fume. Resista. Caso você odeie cigarros, faça força para que seus amigos e familiares deixem o hábito. Não insista até o limite, por muitas vezes uma pequeno comentário tem mais força que um "murro na cara".

Respeite-se. Seu corpo, sua vida e suas vontades. 

Seja feliz. Acredite, isso é uma escolha. Não espere que a vida lhe jogue um pote de ouro no colo e um príncipe ou princesa no caminho. Escolha ser feliz e você jamais reclamará dos seus problemas tolos.

Não seja fúnebre o tempo todo. Seja idiota as vezes, bem como Jabor disse, permita-se voltar a ser criança. Ao lado dos seus filhos principalmente, eles irão adorar.

Não faça da morte um fim... Viva para sempre. Como todo o resto das coisas da vida, é possível. Esforce-se e você verá.

Boa sorte.

quinta-feira, 5 de novembro de 2009

Sopra essa flauta porra !

Som agudo estridente ! Daqueles que fazem as mãos colarem nas orelhas. Te fecha os olhos, mas não completamente... Cerra só até aonde é preciso pra suportar. Em estado de alerta. Mas não te engana com a metáfora, porque não precisa ser si de flauta. Pode ser risada, acorde de guitarra ou batida de carro. É uma porrada ! Vem do nada e desaparece.

Pois para mim:

Me joga pedras.
Fecha as portas.
Fica atrás das cortinas, 
eu sei que gostas.
Tu sobe o muro e conta piadas.
Eu fico no chão e ouso as risadas.
É feito navalha com pouco fio.
Um dia longo demais pra terminar.
Arde os músculos só de lembrar.
E a noite a dentro ouve-se o choro.
Engana o padre, o médico e o touro.
É a verdade perseguindo a vida.
Corre estradas e dobra esquinas.
Uma hora cansas de correr e paras.
Me dá tuas mentiras.
Te ofereço meus murros as tuas caras.

terça-feira, 3 de novembro de 2009

Me diz só uma coisa.

Entre tudo que você é. Existe algo que não pode ser dividido ? Existe algo que caso você perca, deixa junto parte da sua essência ? 
O ser humano tem a chata mania de se considerar indivisível. É verdade. Consideramos nossa vida algo inquebrável. Já partimos do ponto da cultura ocidental recusar o pós vida. Aqui, ninguém gosta de sentar pra conversar sobre o espírito e suas mazelas. A gente quer falar de maquiagem, de cinema, de coisas que queremos comprar e vender e como é legal ser legal. Ninguém que falar sobre morte. 
Eu até entendo. Até.
Dentro de um ciclo curto é complicado inserir o assunto. Te imagina falando com alguém que você conheceu a pouco tempo:
"- E me diz,  como tu achas que vais morrer ?"
A pessoa vai ficar no mínimo constrangida. Uma mente criativa pode pensar que estás querendo ajuda-la na tarefa... Não é o caminho. Mas acho engraçado (em parte ao menos) as pessoas quererem esconder o medo da morte pra si. É estranho até quando temos medo de morrer e vergonha desse sentimento. Como não querer pular de parapente e maquiar esse sentimento com um recém adquirido medo de altura que sempre tive... (???). 
Ter medo de deixar de existir. Se render a própria imaginação viajando pelos tubos que nos levam a vislumbrar nossa inexistência. 
Kafka, por quem eu nutro um grande gostar, fala sobre o existencialismo em sua obra. Ele descreve em uma série de contos formas como poderia morrer... Em alguns o autor é simples e direto como descrevendo o conteúdo de sua caixa craniana sendo exposto ao sol de verão europeu... Em outros é particularmente estranho, como se enforcando nos fios de um varal ou caindo com o rosto apontado para o chão do alto de uma casa, enquanto sorri.
O fato é que nessas passagens Kafka confronta nosso sentimento de jamais deixar de existir. Jamais encontrar o fim do nosso próprio e valiosíssimo existir. E expondo sua ignorância quanto ao que vem depois da vida ele nos força a confrontar nossa própria. Essa é a magia. Percebermos a falta de informação em um medo tão ancestral e nos confrontarmos com a falta de racionalidade em mante-lo flamulando nos mastros de nossas idéias mesmo assim. Quase como que crianças mimadas. Desistimos do resto da conversa por costume. Entregamos os pontos a ridicularização do assunto com comentários que tornam esse tópico um tabu. 
E me ocorre agora, em quantos outros momentos e com quantos outros assuntos tomamos a mesma atitude. Como que criando um campo de proteção aos assuntos proibidos, jamais ultrapassando tal linha. E demonizando os que se arriscarem além da fronteira. Isso é muito importante, demonizar aqueles que ultrapassam os limites impostos pelo nosso contrato social. Eles devem pagar o preço por se arriscarem tão longe. Devem aprender que mesmo entre amigos, amores e família existem assuntos que jamais devem ser abordados. Não por serem grosseiros ou inadequados de fato. Simplesmente, por não termos boas respostas prontas. Simplesmente por não podermos discuti-los com a usual certeza que carregamos em nossos peitos, línguas e cérebros.

Não me espanta, realmente, que cada vez mais as crianças descubram o sexo (e quando eu digo crianças, não falo das de 18 anos... falo das de 10, 11 e 12...). Não me espanta que cada vez mais os números ligados a venda de drogas químicas cresça e que a intolerância esteja tão na moda.

E não acho justo ninguém se espantar.

Porque enquanto mentimos para nossos filhos e amigos. Eles aprendem que mentir é o jeito de jamais encontrar o fim das coisas. Que a mentira prolonga o nosso existir.

Pois que no fim desse texto eu percebo, que a mentira contada nunca engana só os que a escutam. Normalmente ela fascina igualmente aquele que a profere...

"- Ah" disse o rato, "o mundo torna-se cada vez mais estreito. A princípio era tão vasto que as vezes me dava medo. Eu continuava correndo e me sentia feliz com o fato de que finalmente via a distância, a direita e a esquerda e as paredes... Mas essas longas paredes convergem tão depressa uma para a outra. Que já estou no último quarto e lá naquele canto eu vejo a ratoeira que me prenderá..."
"Você só precisa mudar a direção."  disse o gato e devorou-o.