segunda-feira, 11 de abril de 2011

Você não sabe como é sentir isso.

Num planeta tão cheio de certeza e razão. Onde todo mundo sabe o que é certo e errado. Eu perdi meus sapatos. Era uma longa estrada cheia de pedras e plantas com espinhos. Tive que caminhar descalço. E como qualquer pessoa que caminha essa estrada, tropecei nas pedras e sangrei meus pés pisando onde não devia.
"- Não dá pra rir o tempo todo, mas também não precisa chorar o tempo todo..." - me disse um enorme salgueiro a beira do caminho.
"- O que sabes tu árvore ? Nem precisas caminhar, ficas aí parada o dia inteiro... Me deixa !" - respondi tirando um espinho da palma do pé.
"- Eu sei do caminho, e de quem passa por ele. Sei do dia e da noite. Porque como tu mesmo disseste, não posso caminhar. Então o que faço é ver e adormecer sobre o que vi. Idiota." - respondeu de forma rude o salgueiro.
"- Ok. Foda-se. Tchau." -
Dei minhas costas enquanto lhe ouvia dizer:
"- Tu és, como todo outro bípede que passa por esse caminho. Teu tropeço é igual ao de quem tropeçou antes de ti. E ninguém acredita num estúpido salgueiro preso as antigas raizes. Mas antes do fim, caro amigo, vais te lembrar de mim."
Não lhe dei ouvidos, porque ele era um salgueiro. E o que sabem os salgueiros ?
Os dias passam como pó no vento, invisíveis aos olhos desatentos.
Enquanto isso, na estrada, vultos ultrapassam meu caminhar. Como fantasmas cruzam meu corpo sem que eu os sinta de fato. Voando na direção que vou, só que mais rápido. Vejo alguns cairem e se levantarem. Vejo alguns reclamarem dos espinhos. Do sol forte. Do próprio caminhar.
E mais rápido do que posso entender, como num piscar de olhos, estou diante do velho salgueiro novamente.
"- Olá nobre amigo caminhante !" - diz de forma polida.
"- Oi ?" - eu pergunto confuso.
"- Oi !" - responde ele com a ironia que eu gostaria de ter respondido.
"- Ok salgueiro. O que está acontecendo ?" - perguntei modulando minha voz.
"- Sem rodeios ? Gosto disso ! O que está acontecendo é a vida. Sua rotina é estrada. Os fantasmas são as pessoas que permeiam esse viver: seus amigos, seu trabalho, sua família e até os desconhecidos que você sabe existir... De fato, tu não saiu do lugar, o mundo que girou sobre os seus pés. O tempo que passou através de ti. E quem pode dizer sobre o que virá ? Perceba, nobre amigo caminhante: mesmo parado teu viver acontece. Não há necessidade de se lutar contra isso. Nem de obrigatoriamente ficar parado vendo tudo acontecer. Nada que possas fazer mudará isso. Siga teu caminho ou simplesmente, deixe o caminho seguir através de você..."
"- Caralho salgueiro, tu é foda !"
"- Chega de palavrões, ok ?" - me pediu ele.
"- Ok, mas chega de ex namorados dela. Pode ser ?" - indaguei.
"- Talvez caminhante. Não posso te garantir isso, você precisa passar pela estrada para saber... Tudo bem ?" - disse calmamente o salgueiro falante, parecendo ter saido de uma viagem de LSD.
"- Ok, um salgueiro malandro está me dando conselhos amorosos... O quão ruim isso pode ser afinal de contas ?"
"- Muito pouco, é verdade. A pergunta certa seria: o que te reserva o próximo passo ?"
Olhei pro céu, era azul brigadeiro. Olhei pro caminho e as pedras pareciam ter se afastado um pouco do centro. Algumas inclusive gritavam:
"- Pisa, pisa, pisa, pisa !"
Olhei pro salgueiro e tinha um sorriso estampada no seu tronco. Pensei:
"- O que o próximo passo pode me trazer ? Vou precisar caminhar para saber. Afinal, essa é a estrada que tem meus pés. E esse são os pés que tem esta estrada... Que seja."
"- Obrigado salgueiro !" - respondi com um sorriso de retorno a grande árvore.
"- Até a próxima curva nobre caminhante, até a próxima curva..."


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