sexta-feira, 24 de julho de 2015

Aquele que navega dor.

Viver não é preciso, navegar é preciso. Plutarco me disse que Pompéu lhe contou. Na verdade, o google me disse que Plutarco disse o que Pompéu lhe contou. Navegador que não sou, me senti velejando nos mares da vida desse planetinha com o endereço "via lactea fundos", perdido no espaço sideral. 
Isso me levou para além dos nossos dias. E quem de nós não é navegador? Quem nunca se sentiu sobre a proa da vida, sendo levado por ondas que alguém pode controlar, mas não nós. E quando essas ondas se transformam em uma espécie de tempestade? Aí somos obrigados a navegar a dor. Como um bom navegador faz.
Meu pai um dia me disse que "mar calmo nunca fez bom marinheiro". E eu não entendi o que ele disse até que a tempestade o levou do nosso barco no meio da noite. Eu quase o ouvi gritando: "o barco é teu agora pequeno!".
Mas pode ter sido só a minha imaginação.
Bom, nós puxamos as cordas, viramos a embarcação para a terra e voamos sobre o mar. Era bom que chovia, nossas lágrimas se escondiam na água que escorria pelos nossos rostos. Foi uma viagem rápida. Atracamos em um porto esquecido por muitos outros e esperamos a tempestade passar. Alguns dias depois, já limpávamos o convés e reparávamos as velas com remendos. Fizemos tudo como se ele ainda estivesse no comando. Era como se seguíssemos as ordens que o nosso antigo capitão daria se ali ele estivesse. Foi mais fácil assim, eu acho. Falamos pouco. Trabalhamos duro. As vezes, eu acordava durante a noite, ou já com o sol nascendo e ouvia alguém soluçando. Eram lágrimas de dor, eu sempre soube. Lágrimas que só esse tipo de dor sem consideração alguma pelo indivíduo que habita provoca. Considerava esse som tão íntimo quanto os gemidos de prazer um casal enamorado buscando conforto nos braços um do outro. Assim, nunca falei sobre ele. Muitos dias nasceram e tantos outros morreram, até que uma nova tempestade como a daquele dia nos encontrasse. E quando essa hora chegou, mais de um de nós gritou ordens ao mesmo tempo. Nós nos olhamos como que tentando entender quem deveríamos seguir. E no meio da confusão, no meio dos trovões e das ondas que formavam paredes de água nas laterias da nossa embarcação, alguém disse:
"- Façam como ele faria. Façam como ele nos mandaria fazer!"
E todos soubemos que era essa a ordem a ser seguida.
Viver não é preciso, navegar é preciso. Eu entendi, Pompéu falava da precisão e não da 
necessidade. Quem sabe quando outra tempestade virá? Não há como precisar. Mas nós estaremos aqui. Puxando as cordas e erguendo as velas. Virando o leme e sobrevivendo.
Hoje, mesmo depois de tantos anos após aquele barco ter sido afundado e a maioria de nós agora, termos nossas próprias embarcações. Sabemos o que fazer quando a tempestade chega.
Fechamos nossos olhos.
Cerramos nossos punhos.
E fingimos que ele está entre nós, falando com uma voz calma e firme. Exatamente o que precisa ser feito.
Nós somos aqueles que fazem como ele faria.

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