terça-feira, 27 de janeiro de 2015

Até quando?

Ela usa o sexo como uma algema. Desde que transara pela primeira vez a muitos anos atrás, foi assim. Antigamente costumava ser pior. Dependendo da forma como a tratavam. Do tamanho que tinham, fosse de um penis desproporcionalmente assustador ou do tamanho da vontade.
Não, ela não é uma prostituta. É engenheira. Formada, pós graduada e muito respeitada profissionalmente por todos que a conhecem. É formada em uma universidade federal. Especializada fora do país. Rejeitou três cargos antes de aceitar a direção de projetos de uma construtora mexicana. Fala, além de espanhol, alemão, inglês e faz aula de mandarim a anos.
Esteve solteira pelos ultimos anos, porque do último relacionamento, a única boa herença é um gato chamado Pulga que até hoje tem em casa. "Foi culpa minha" - ela confidenciou para suas duas melhores amigas. "Somos incompatíveis, eu e ele... Melhor assim.".
Mentira. Mesmo ele sendo um babaca, mesmo ele sendo grosseiro e mal educado. Mesmo sendo ignorante e agressivo. Mesmo quando ele lhe dava tapas no rosto e ela chorava enquanto tomava banho... Ela ainda carrega essa espécie de lacuna dentro do peito. Uma lacuna que parece ter crescido com o passar dos anos. Uma lacuna que parece ter se enraizado em seu rosto, o que a faz poder ser identificada pela ausência de um companheiro amoroso. Seus amigos tentam lhe apresentar pessoas. Ela baixou o Tinder no seu celular. Fez um facebook e procurou por varios ex "cachos" da faculdade, colégio, etc...
Recebeu vários chamados, aceitou alguns convites para jantar. Transou um par de vezes. Trocou alguns telefones. E até chegou a esperar que um número daqueles todos lhe ligasse.
Ninguém ligou.

Não. Ela não é feia. Também não é linda. É uma mulher normal. Dessas que se esforça para ficar mais bonita. Que esconde a celulite (apagando a luz). Que cuida quase excessivamente dos cabelos, sua o corpo em atividades físicas, aprende técnicas de maquiagem com a ajuda de videos do youtube, se arrumando bem, tendo colocado proteses de silicone (porque achava os seios feios), sendo simpática (mesmo quando o assunto é uma bosta), sendo divertida (até onde consegue se esforçar) e dançando de uma forma "pseudo sexualmente atrativa" (isso, porque gosta mesmo). Ela não é nem um pouco feia.
Ainda assim, ela tem a sensação de que seu sexo é uma algema. Uma forma de "prender" o outro. De lhe cobrar a fidelidade monogámica em troca do prazer físico fornecido.
E o pior é que a cada novo parceiro que passa por ela, se sente pior. Cada vez menos envolvida pelo processo. Se sente menos surpreendida pelos trajeitos do outro. Ela reduz a relação antes de ela acontecer. Identificando os padrões que existem entre a troca de olhares no bar/restaurante/boate até  a bunda nua dele indo embora da sua cama, rumo ao banheiro. Rumo a porta do apartamento, com alguma pressa. 

Rumo a nunca mais ser vista por ela.
Rumo ao próximo olhar, no próximo bar/restaurante/boate e consequentemente a próxima bunda... Em um ciclo sem fim.
Ela é mais. Sabe disso. Mas se sente menos. Se sente menor. Se sente criança sem mãe, desprotegida de um mundo que lhe deseja como mulher feita. Como mulher puta. Como adulta libidinosa, fornecedora de gozo.
Por isso chora.

Não pela presença do desejo.
Mas pela ausência do que lhe justifique a vontade, além do ato mecânico de acasalar.
Pelo vazio do coração que ela nem sabe se quer preencher.
Mas que tem certeza, odeia a sensação de oco. 


Ela é triste. Tão triste, que no dia que o karma/destino/acaso/seja lá o que for, lhe apresenta alguém bacana... Ela finge que escuta sua conversa e foge assim que tem uma brecha.
Por preferir dormir sozinha e não ver nenhuma bunda apressada lhe fugindo da algema.



Sem comentários:

Enviar um comentário